Todos temos um lugar, uma personalidade e um viver no caminho para a morte.
Segunda-feira, 18 de Maio de 2009

 

    

      O homem, pelo progresso, luta cada vez mais contra a Natureza, sobretudo no âmbito da construção civil e obras públicas, tantas vezes revolvendo e destruindo terras agrícultáveis ou de floresta, desagregando ou desfazendo massas de rochas, podendo com isso desequilibrar em algo o ecossistema de uma região ou de um local, ou  provocar alguma carência de alimentos ou de matérias-primas vegetais, que depois terão de ser importados, ou podendo causar deslizamentos de terras que poderão ser perigosos sobretudo para vidas humanas, ou morrerem alguns trabalhadores enquanto trabalham, devido às, por vezes, tão deficientes condições de trabalho, tão arriscadas, dando origem a tantos acidentes de trabalho, que põem Portugal a esse respeito, infelizmente, num dos lugares cimeiros na Europa. 

     O chamado progresso, ainda que útil, muitas vezes assemelha-se a uma entidade contra a qual parece não se poder parar e ter de se lhe dedicar tudo o que seja moderno e considerado necessário e que traga grandes lucros em dinheiro, camuflados de conforto e de postos de trabalho, embora às vezes seja pior a emenda que o soneto.

     Enquanto trabalham, os trabalhadores, além de se lhes dever dar todas ou o máximo de condições de segurança, implementadas pelas próprias empresas e fiscalizadas pelas  inspecções do trabalho oficiais, devem, eles próprios, desempenhar os seus serviços cumprindo rigorosamente as normas de segurança e, mesmo assim, com o máximo de precaução e atenção.

     O pior de tudo é que sempre houve e continua a haver falhas, por vezes graves e trágicas, ao nível das empresas empregadoras, ao nível  das inspecções oficiais e ao nível também dos trabalhadores, a que podem juntar-se também, posteriormente, depois dos acidentes, falhas no funcionamento dos hospitais.

     Transcrevo, a seguir, um poema que há muitos anos fiz, algo relacionado com o que foi dito atrás.

 

 

 

                                                    O homem  e a rocha

 

 

A rocha espera, espera,

silenciosa,

no seu leito de monstro morto,

embebida em tempo que a não desperta

com carícias de mole cinzel;

mas o homem,

que não se conhece

e se procura

no éter  e nos avessos do que pisa,

vai ali

procurar-se:

 

olha,

pensa

e despreza a vontade do pétreo ser;

empunha sua máquina,

martelo pneumático,

que às vezes lhe trai

a pátria de raciocínio,

e toca de a fazer rugir

como o mais feroz monstro

contra o sono de pedra

velado por milénios.

 

É monstro

contra monstro,

homem de rocha

e rocha para homem;

ruge o homem na máquna,

a pedra ameaça com chispas;

há desafio,

há luta;

o homem arqueja

e rende-lhe a rocha dois calhaus;

ambos estão exaustos;

armistício.

 

O contendor humano

muda rios de suor

do cimo da testa

para as costas das mãos

e olha o adversário com ódio,

e a pedra aguarda

toldada pelo seu suor de pó.

Cospe o primata nas mãos,

esfrega uma na outra

e de novo o combate:

 

luta,

rugidos,

chispas,

teimosia de onagro,

firmeza de rocha,

uivos de dor do ferro,

chispas,

raiva,

e de repente ...

 

Rasga

as frenéticas entranhas do homem

um berro de dor selvagem,

voam-lhe da máquina as mãos

para arrancar ao olho ferido

a flecha de pedra

que lho cega

e lho queima em vulcão de loucura.

 

Inútil o seu desespero,

uiva,

esfrega,

chora,

está cego,

louco de dor ...

 

A ambulância vem buscá-lo,

estridentemente,

e despeja-o no hospital.

 

E a rocha

esfria e adormece de novo,

como as enormes e plácidas pedras,

no fundo do tempo infinito.

 

 

 

 

(Poema meu.)

 

 

 

 

 

 

 

                                                                                                     Mírtilo

 

 

 

 



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