É de lamentar, mas cada vez há mais erros e desleixo a falar a língua portuguesa, praticados quer pelo cidadão comum, com as desculpas que pode ter, quer, para pior e com desculpas muito menos aceitáveis, por pessoas que ocupam lugares proeminentes na difusão da nossa língua, como, por exemplo, jornalistas, escritores, políticos, professores ... E os erros vão ficando, vão fazendo escola, má escola, claro, de modo que deixarão de ter emenda, ficando para sempre, o que será totalmente lamentável.
Darei vários exemplos, vulgares, do mal que se fala e escreve por aí a nossa língua.
- A palavra «tóxico» (assim como os seus compostos: «intoxicar», etc.) a ser erradamente lida «tóchico» em vez de «tócsico».
- A palavra «rubrica» (sem acento) erradamente pronunciada (e até escrita) «rúbrica».
- As palavras «juniores» e «seniores» (sílabas tónicas no «o», plurais de «júnior» e «sénior») erradamente pronunciadas (e até escritas) «júniores» e «séniores» (com acento).
- A 1.ª pessoa do plural do pretérito perfeito simples do indicativo dos verbos terminados em «ar», que até leva acento agudo, a ser lida erradamente como terminando em «amos» (que é a correspondente terminação do presente), em vez de «ámos» (com acento) (exemplos: pretérito — «louvámos», «observámos», «cantámos», etc.; presente — «louvamos», «observamos», «cantamos», etc.).
- A palavra «parolímpicos» (em expressões como «Jogos Parolímpicos», «atletas parolímpicos») dita e escrita erradamente «paralímpicos» (igual a prefixo grego «para» mais «olímpicos», não podendo o «o» inicial da palavra-base de «olímpicos», Olímpia, ser deturpado ou suprimido, tendo de cair o «a» final do prefixo «para», que nada altera, como acontece em «paroftálmico», «parorgânico», «parótico», «parónimo», ou em «parencéfalo», «parestatal», «pareléctrico», etc.).
- A 3.ª pessoa do singular do pretérito perfeito simples dos verbos terminados em «ir» precedido de vogal (exemplos: saiu, ruiu, caiu, etc.) a ser escrita erradamente com acento no «i» e a 3.ª pessoa do plural dos mesmos verbos (saem, ruem, caem, etc.) a ser erradamente escrita e pronunciada com um «i» entre as vogais finais («saiem», «ruiem», «caiem», etc., formas incorrectas).
- O «à» (contracção da preposição «a» com o artigo definido «a») erradamente escrito com acento agudo. E até há muita gente que escreve assim o «há» do verbo haver.
- As expressões «de forma que», «de modo que» ou «de maneira que» erradamente construídas com um «a» antes do «que» («de forma a que», etc.).
- A expressão «fazer que» a ser erradamente construída como «fazer com que».
- A expressão «portas travessas» dita e escrita erradamente «portas e travessas».
- A expressão latina «pari passu» («com passo igual», «a par», «de perto») erradamente dita e escrita, como se fosse português, sobretudo na Comunicação Social, «a par e passo».
- Particípios passados irregulares usados erradamente em vez dos regulares com o verbo «ter» por auxiliar (tempos compostos). Exemplos: «tenho gasto muito dinheiro» (errado) em vez de «tenho gastado [...]» (certo); «tenho limpo a cozinha com um bom detergente» (errado) em vez de «tenho limpado [...]» (certo); «tenho expresso a minha opinião» (errado) em vez de «tenho exprimido [...]» (certo), etc.
- Omissão errada, muito generalizada, do «de» antes do «que» junto a verbos que exigem esse «de», geralmente verbos, ou expressões verbais, que exprimem estados de espírito, ou operações cerebrais, sobretudo se conjugados reflexamente, como, por exemplo, «convencer-se (ou estar convencido) de que»(certo); «lembrar-se de que» (certo); «aperceber-se de que» (certo); «gostar de que» (certo) (com o verbo «gostar», por ser geral e de há tanto a omissão do «de», quase parece um sacrilégio linguístico ter de o admitir); «informar-se de que» (certo); «estar à espera (ou ter esperança) de que» (certo); etc.
- Expressões como «sociais-democratas», «democratas-cristãos», quer sejam adjectivos ou substantivos, ditas e escritas erradamente «social-democratas», «democrata-cristãos» (com o primeiro elemento no singular), sobretudo na Comunicação Social. A regra de o primeiro elemento ficar no singular aplica-se quando esse primeiro elemento é adjectivo e termina no masculino em «o», mesmo que seja uma redução do adjectivo original. Exemplos: «económico-financeiros»; «afro-europeus» (sendo «afro» a redução de «africano»); «israelo-árabes» (sendo «israelo» a redução de «israelítico») (tal como «luso» se tornou a redução de «lusitano», ou «hispano» a de «hispânico»); etc.
- A expressão «por que» (equivalente a «pelo qual», «pela qual», «pelos quais», «pelas quais») usada erradamente numa só palavra («porque»), tendo antes ou depois o seu referente: «motivo, causa, objectivo, fim», etc. Exemplo: «O motivo (causa, fim, etc.) por que esperas é bom.» E será também em duas palavras («por que») mesmo que o referente esteja apenas subentendido. Numa só palavra («porque») emprega-se como conjunção causal, equivalente a «visto que», como conjunção final, equivalente a «para que», mas pouco ou nada usada actualmente, e como advérbio interrogativo, segundo alguns gramáticos e linguistas, mas apenas referido a «motivo» — exemplos: «Porque esperas?» (subentendendo-se «motivo»), mas «Por que esperas?» (subentendendo-se, por exemplo, «coisa»).
- A expressão «de mais» escrita erradamente numa só palavra («demais») quando significa «demasiado», ou se opõe a «de menos». Exemplos: «isto é de mais», «é rico de mais», «é longe de mais». Só se escreve «demais» no sentido de «outros» («estes ficaram, os demais partiram») ou na expressão adverbial «demais a mais» (sentido de «além disso»), muito pouco usada actualmente.
- As expressões «se não» e «senão» usadas muitas vezes com confusão ou erradamente. A primeira, «se não», é a vulgar conjunção condicional «se» e o advérbio de negação «não» (exemplo: «se não comeres, morrerás»), ou é equivalente a «se é que não» (exemplo: «custará centenas, se não milhares de euros»). A segunda, «senão», equivale a «quando não» (exemplo: «estuda, senão não passas no exame», ou equivale a «a não ser» (exemplo: «não progrides senão trabalhando», ou indica exclusão, equivalendo a «só» («ele não tem senão 20 euros»), ou funciona como substantivo («para chegar lá, só há um senão»).
Há também outras expressões, no género destas últimas, que suscitam confusão e se escrevem igualmente, muitas vezes, erradamente, como «abaixo» e «a baixo», «acima» e «a cima», «detrás» e «de trás», «onde» e «aonde», etc., cujo esclarecimento ficará para uma próxima oportunidade. Acrescente-se que há também muita confusão e erros na escrita de palavras iniciadas por certos prefixos, como, por exemplo, «anti», «contra», «intra», «hiper», «inter», «semi», etc., a respeito de se lhes seguir ou não hífen, o que também oportunamente se abordará.
E, como tem sido costume, ou regra, publicar, além da parte em prosa, um poema meu, mais ou menos ou de todo relacionado com o assunto do «post», também agora se segue um soneto algo nessas condições.
Televisão
É inegável ser preferida a televisão
de entre os órgãos de comunicação social,
e sobressai, pela visão do mundo, o telejornal,
mais pelas más notícias ou de grande sensação.
Também de lamentar é a restante programação,
desequilibrada e mais má que boa ou normal,
e a luta pelas audiências, concorrencial,
quase mais não é que lamentável imitação.
Destaque-se, em qualquer televisivo canal,
pouco se programar cultura e educação.
E até à lusa língua a tratam algo mal
apresentadores de TV, ante a Nação,
ao dizerem, por exemplo, e é habitual,
«jogos paralímpicos», «intochicação» ...
(Poema meu.)
Mírtilo